sexta-feira, 18 de março de 2016

Malandro é o gato


Já estava me preparando pra me despedir da zona Leste, de malas prontas, em pouco tempo, iria para a Chácara Bela Vista. Normal, que nesse tempo eu tivesse dado uma pausa nas atividades esportiva, portanto, deixei o Dínamo em espera.
Foi nesse tempo, que me convidaram para cuidar do primeiro quadro do Unidos do Morro, aceitei o convite, pra provar(pra mim mesmo) que não era um treinador do infantil, posto que, algumas pessoas, assim me rotulavam.Acompanhei o time, durante duas partidas, pra estuda-lo.Convoquei pra minha assistente, a inoxidável 
Alessandra Zaffani, pra me acompanhar nessa aventura.Assistimos as partidas e, observei que, apesar de ser muito forte, em termos de valores individuais, não tinha qualquer noção de continuidade e padrão de jogo.Apesar de ter oTchesco Nascimento e seu irmão Carlos Alberto no meio de campo, faltava organização e, apesar de começar ganhando os jogos, terminava cedendo o empate e terminava por perder os jogos.Ah, ainda tinha o problema de hierarquia, todo mundo se julgava apto a comandar.Logo que cheguei, pude ouvir, de um dos jogadores do segundo quadro, a seguinte piadinha:O que um técnico de crianças veio fazer aqui??Pilhéria, que eu fiz não ter ouvido... melhor mostrar, que bater boca.
Bom, ficou combinado que eu assumiria o comando na terceira partida e, seria num festival em Carapicuiba-SP, na COHAB 5, contra o imortal Avaí.
Bem...quem não sabe nada da Várzea de São Paulo, não faz a menor ideia do que eu estou falando, o citado time já era grande, quando nos anos 70, a Copa Kaiser, ainda era chamada de "Desafio ao Galo" e, era transmitida pela Rede Record, com narração de fausto Silva, todo domingo. De manhã. Isso...e, estava eu, na primeira e maior COHAB do Brasil, no campo do "BICHO PAPÃO", faziam 8 anos que o primeirinho deles não sabia o que era derrota.8 anos sem perder pra ninguém.
Técnico de crianças ???Fica aí!
Logo ao chegar, fomos recebidos com vaias e intimidações. Olhei pra Alê e ela estava tranquila, sempre me impressionou isso nessa menina, em casos que muitos homens afinavam, ela pelo contrário, se impunha...a espetacular Alê.
Infelizmente, as pessoas não estudam os adversários, eu era a única pessoa que conhecia a historia do Avaí, o segundinho entrou em campo e, jogou, de igual pra igual.Melhor dizendo...tentou jogar (na verdade, nem viu a cor da bola)quando caminhávamos para o vestiário, encontramos os jogadores do segundinho, vindo cabisbaixos e o técnico gritou:Esse nós ganhamos de 8 x 0, o primeiro vai de 16, disse isso e cutucou meu peito com o polegar, se eu estivesse na minha casa...mas eu estava na COHAB 5, tranquilamente olhei pra arquibancada, que esperava a reação: Bom nesse caso, a gente já pode ir embora, né???Vocês já ganharam e o jogo nem começou. Como quem se sente contrariado, o cara saiu da frente e me deixou entrar no vestiário.Lá dentro encontrei um time totalmente apavorado, uma bagunça, todo mundo falando ao mesmo tempo, só uma pessoa estava calma, o tal do Tchesco e, como ele me conhecia, estava esperando eu entrar em ação.
Pedi que me ouvissem, continuou a balburdia, pedi atenção de novo, nada.O Tchesco estava sentado e agora ria, havia uma cadeira na minha frente, dei-lhe uma bica, a cadeira voou e chocou-se contra a parede, os jogadores se assustaram e voltaram a atenção.Só quem fala aqui sou eu, estamos entendidos ???E como ninguém se manifestou, continuei... O grande problema aqui é o seguinte: todo mundo vem aqui, pra encarar esse time de nível profissional e, nós não somos profissionais, nós temos a pretênção de ser... então vai ser assim...excepcionalmente hoje, nós somos 10 volantes e 1 goleiro, defendemos o jogo todo e, quando chegar a hora eu aviso.
Basicamente era isso, nós iríamos defender, o time todo, o tempo todo e, eu tinha um trunfo na manga.A Alê já me esperava no banco, pedi que atualizasse o relógio e me falasse a cada 5 minutos, subitamente me aparece o dono do time, o Gavião dizendo que apenas o técnico, mais 1 pessoa poderiam permanecer no banco de reservas.Na lata, eu disse tchau(de que iria me servir um presidente do meu lado???)
E, assim o Dínamo tomou o "comando" do Unidos do Morro...dois no campo e dois no banco.Começou o jogo, do jeito combinado, os caras jogavam muito mesmo...gritaram que o trio de meio-campo era da Associação Atlética Ponte Preta, mas o nosso time defendia e, tome bola pro mato.(Já viu esses times que o lateral esquerdo vira a bola no peito do lateral direito e vice-versa?)Acontece que o meu time gostou de fazer isso, teve uma hora que o nosso centro avante estava dando combate ao lateral adversário, na nossa área.Primeiro a torcida fez piada, chamou o nosso time de fazendeiros, eles tocavam a bola e nós a mandávamos pra fora.
Acabou o primeiro tempo e fomos para o vestiário rindo, a empáfia deles já não era a mesma.No vestiário todos fizeram silencio, pra me ouvir:-Muito prazer, meu nome é Nilton, a gente vai continuar jogando do mesmo modo, somos visitantes, quem tem obrigação de ganhar é o dono da casa, quanto mais o tempo passar, mais a obrigação de ganhar vai apertar a vaidade deles, e...até a hora que eu mandar, a gente não muda.Fechamos para gritar o nome do time e, já era outro time, um time com alma...o Tchêsco, ainda sorria.
Na saída do vestiário, o Gavião, por trás do alambrado me disse:-To começando a entender o que você está Fazendo, você é malandro. Antes que a vaidade me dominasse a Alê me socorreu, só o fato de ela estar lá, já me lembrava que eu era técnico do Dínamo, que significava "humildade", ela esfregava as mãos, como se antecipasse uma historia repetida, brilhavam, os olhos dela.
Começo do segundo tempo, empolgado com o desanimo do time da casa, nosso time vacilou, e o que parecia impossível aconteceu, eles fizeram um gol, e, por incrível que possa parecer, isso estava nos meus planos.Enquanto o nosso time levava a bola pro meio de campo, visualizei o Tchêsco e acenei com a cabeça, até aquele momento, nosso time mal tinha passado do meio de campo e, ninguém marcou o Neguinho, ele recebeu a bola e pariu em diagonal, com 3 toques, ele já estava na cara do goleiro, o goleiro que, durante a partida toda não tinha tocado na bola saiu, mas era o Tchêsco, quando o goleiro saiu a bola já lhe havia coberto.Jogo empatado.Quanto mais o tempo passava, mais vergonha crescia e, tome bola pro mato.Silencio na torcida, ainda que com um certo medo, os caras do segundinho torciam, medo porque estávamos na COHAB 5, os últimos minutos de jogo foram mais calmos, já que o fôlego deles acabou-se, era cômodo, pros dois time que a coisa fosse mesmo para os pênaltis, e assim foi.Nosso time já comemorava como se fosse vitória e, só aí apareceu o truque na manga...O goleiro Marcio, podia não ser grandes coisas como goleiro, era mesmo medíocre, mas, pra pegar pênaltis, não tinha melhor.Depois 8 anos de reinado, o grande Avaí de Carapicuíba, caiu.
O Unidos do Morro começava a ganhar um padrão de jogo, tive a grata satisfação de saber que o time do Gavião subiu tanto que conquistou a Copa Kaiser.
E pensar que tudo começou com um técnico de crianças, né !?!

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